Movido pelo binómio Trauma e Bravura, o FITEI 46 busca investigar como o teatro é capaz de evocar conceitos como violência, memória e política, tão intrínsecos às comunidades afro-ibero-americanas.
É do contacto com os artistas e suas obras que emergem as urgências dos nossos tempos, reveladas sobre os palcos através da arte e daí surgindo também a nossa visão temática.
Os ataques à democracia em diferentes partes do mundo, em particular, nos países da América do Sul, a crise migratória, nas fronteiras dos países do norte com os do sul do mundo, o recente passado colonial em África ou ainda a guerra que atravessamos em território próximo do nosso, são algumas das questões que impulsionam os nossos artistas convidados a darem visibilidade, forma e significado a estas recorrentes experiências marcadas pela violência. Como podemos então reestabelecer a bravura para confrontarmos todos estes traumas?
A programação do FITEI 46 é marcada por espetáculos internacionais, nacionais e locais, reunindo artistas consolidados no panorama teatral. No total são 14 espetáculos, sendo que 7 deles são coproduções e quatro deles resultam de residências artísticas no festival, sinal de uma organização cada vez mais empenhada no acompanhamento e do amadurecimento de projetos artísticos.
A abertura do evento estará a cargo do espetáculo #5 BOCHIZAMI, nova criação da artista Flávia Gusmão, em coprodução com o Teatro São Luiz, Lisboa. Nela a artista promove um olhar sobre a diáspora cabo-verdiana no nosso país, neste processo de criação desenvolvido nos dois territórios.
De regresso ao FITEI, após a passagem na edição de 2018, os catalães da Agrupación Señor Serrano estreiam em absoluto, UNA ISLA, um projeto que reflete sobre a “bolha de ódio” construída através das redes virtuais, com o selo dramatúrgico e dispositivos cénicos que caracterizam a obra da companhia: tecnologia em palco, uso de vídeo em tempo real, manipulação de objetos e câmaras de vídeo, projeções e dispositivos de visualização, e inteligência artificial, através de uma dramaturgia multifacetada. Estrearemos em Portugal, HAMLET, de Chela Ferrari, uma obra que conta com intérpretes com Síndrome de Down, numa inspirada visão do texto shakespeariano.
Receberemos também, SUBTERRÂNEO - UM MUSICAL OBSCURO, colaboração entre os portugueses Má-Criação e os brasileiros dos grupos Foguetes Maravilha e Dimenti, onde o ponto de partida foram as notícias sobre os 33 homens presos num desabamento na Mina San José, no Chile, em 2010, gerando um espetáculo sensorial onde a ausência de luz ganha novos contornos.
Victor de Oliveira, artista da diáspora luso-moçambicana, “há demasiado tempo paralisado no limbo em que a História o colocou”, apresenta LIMBO, um mosaico narrativo que, entre outros elementos, percorre a história íntima de um homem mestiço nascido em Moçambique. Entre a autoficção e a ficção social, questiona as razões do negacionismo histórico, as disputas da memória coletiva, as experiências de crescer na indefinição.
Já em MORIA, Mario Vega propõe-nos uma experiência imersiva de teatro documental ao recontar a história de duas refugiadas e suas famílias que são forçadas a fugir do seu país, com apresentações no Porto e também descentralizadas na cidade de Viana do Castelo.
O TEATRO BOMBÓN GESELL, mais uma das coproduções FITEI, foi criado enquanto uma “provocação cénica que reúne artistas, pensadores e curadores para refletir sobre a violência e a justiça na Ibero América”, e que assim, e depois de um período de residência artística com intérpretes portugueses, continua o trabalho de criação dos dispositivos Gesell, que se materializa na apresentação de espetáculos curtos, de Portugal, Argentina, Chile e Perú, seguidos de uma mesa-redonda.
Apresentaremos ainda QUE NÃO SE FALE DOS VELHOS TEMPOS e CONDOMÍNIO, obras das companhias que estiveram em residência na edição de 2022, dirigidas respetivamente pela Grua Crua e por Nuno Nunes.
As residências artísticas de Marina Otero, com vista à sua nova criação e da coprodução FITEI com o Hotel Europa, para o seu novo espetáculo LUTA ARMADA a estrear em 2024, ajudam-nos a perspetivar as próximas edições do certame.
Contaremos, ainda, com a estreia do importante projeto desenvolvido pelos portuenses Visões Úteis; IBÉRIA SECTOR 5, que se dedicaram a mergulhar nos arquivos do FITEI, aproveitando a digitalização do seu espólio audiovisual, gerando uma obra com perfil de reenactment e de conferência performativa; a Plataforma UMA com a estreia de PILOTO, obra encenada por Joana Magalhães, Mafalda Lencastre e Maria Inês Marques; SISTEMA a nova criação de Cristina Planas Leitão; SE EU FOSSE NINA, de Rita Calçada Bastos, com Carla Maciel; COSMOS, de Cleo Diára, Isabél Zuaa e Nádia Yracema, completam o resto da seleção FITEI 46.
A realização de atividades formativas, na secção Isto não é uma escola FITEI; o encontro de programadores internacionais, contando com roda de negócios com grupos portugueses e showcases, entre outras actividades, na secção FITEI PRO; o FITEI ABERTO com ações como a CRÍTICA PERFORMATIVA dos brasileiros Ruy Filho e Patrícia Cividanes, concertos/aparições com PHOLE e ARIANNA CAELLAS e KAUÊ GINDRI, festas, lançamento de publicações, debates e conferências; e ainda a secção FITEI e as escolas do Porto, articulada com as escolas artísticas da cidade, constituem, também, fortes atrações da edição de 2023.
A todos os parceiros, patrocinadores, cooperadores, amigas e amigos do festival, muito obrigado por contribuírem para mais uma edição do FITEI, em nome de toda a equipa agradeço o vosso apoio. Ao público, convido a que venha procurar, em todos os espaços onde se realizarão as nossas atividades, a beleza, a provocação, a dor, o êxtase, a reflexão, a intensa vida das/os artistas maravilhosas/os, que formam a programação da 46ª edição do Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica.